Febre do ouro castiga floresta no Amazonas
João Vita - Diário do Pará
Desde a descoberta de Serra Pelada, na década de 70, não se via igual corrida pelo ouro na Amazônia. Quando o garimpo do Juma, no município amazonense de Novo Aripuanã, começou a ser explorado por meia dúzia de agricultores, em novembro do ano passado, o cenário da região experimentou uma de suas piores transformações. Levas de aventureiros do próprio Amazonas, de Rondônia, Mato Grosso e Pará passaram a desembarcar na pequena cidade de Apuí, principal base de acesso ao garimpo e com população de 18.790 pessoas. Calcula-se que cerca de cinco mil homens já tenham se instalado nos precários acampamentos em torno do “Eldorado do Juma”, a cerca de 450 quilômetros ao sul de Manaus. Estimativas não oficiais dão conta de que, até hoje, cerca de 300 quilos de ouro podem ter sido retirados da região.
O desmatamento, o barulho de bombas de sucção e o barro que tinge a água dos rios e igarapés contrastam com a paisagem verde ao redor das escavações no meio da floresta. “O cenário no local muda constantemente”, relata o fotógrafo paraense Paulo Santos, das agências Reuter e Interfoto, um dos poucos jornalistas a permanecer durante uma semana no garimpo. Segundo ele, o que era caminho um dia passou a ser buraco em outro. Cursos de igarapés são interrompidos, a mata é derrubada e o barro transforma pequenos deslocamentos em verdadeiras odisséias. É preciso calçar chuteiras para dar passos sem deslizar, mas a maioria dos garimpeiros passa o dia com os pés atolados no barro. Alguns buracos têm 25 metros por seis de profundidade. Embora o uso de máquinas, de jatos de bico e mercúrio seja proibido, os estragos são evidentes para quem sobrevoa a área do garimpo.
Força feminina no garimpo
Muitas mulheres circulam no garimpo - a maioria, de bateia na mão, lavando cascalhos e mergulhadas até a cintura. Luciana Bibo, 31 anos, casada e mãe de três filhos, trabalhava no Mato Grosso como corretora de empréstimos e não tinha planos de ficar no garimpo. Chegou ali para resgatar o marido, doente de malária. Com faro para negócios, mandou o companheiro para a cidade e se instalou no Juma. Hoje, ela comanda 22 homens - dez empregados e doze com os quais divide o lucro. Em 40 dias, Luciana calcula ter retirado do garimpo 800 gramas de ouro.
Dentro do Juma, o grama do ouro é negociado a R$ 37. Um dos compradores é Nilberto Brasil Leite, 40 anos. Ele era comerciante de gado em Mato Grosso, mas seus negócios estavam a caminho do brejo quando teve notícias do novo garimpo. “Reuni algum dinheiro e me mudei para cá”, diz ele, enquanto atende um dos muitos garimpeiros que circulam por sua cabana durante o dia. Boa parte do dinheiro que os garimpeiros recebem dele é deixado no boteco. Quem vive na corrutela bebe todo dia e o dia todo. Muitos que perderam tudo e não conseguem voltar para a cidade, permanecem ali, vivendo como podem. Em pleno garimpo de ouro, há quem sobreviva até de catar latinhas de cerveja.
Movimento reduziu nas últimas semanas
Apesar da euforia inicial, o movimento no garimpo teve o ritmo reduzido nas últimas semanas, segundo o DNPM. Muitos estariam se decepcionando com a dificuldade de encontrar ouro e com a vida dura no garimpo, onde grassa a malária, a febre amarela e as doenças sexualmente transmissíveis. Na avaliação de técnicos, o ouro está concentrado numa pequena região e não se trata de uma reserva para atender os milhares de garimpeiros que correram para lá. Essa constatação teria reduzido bastante o fluxo migratório em direção a Apuí. As últimas informações da prefeitura local dão conta de que mil dos cerca de seis mil garimpeiros atraídos pelo garimpo já deixaram a região. Pelas contas do prefeito Antônio Roque Longo, 70% dos que ainda teimam em garimpar na área são moradores da cidade ou de localidades próximas. Levantamentos geológicos apontam que o garimpo desse ouro de fácil extração tem vida curta. Deve durar cerca de dois a oito meses.
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