domingo, julho 29, 2018

Expedição América do Sul de Moto, Tintim por Tintim, Parte 2

O banho no primeiro dia na Venezuela
Ainda no nosso primeiro dia na Venezuela paramos em um lugar, na beira da estrada chamado Pedra da Virgem, ponto obrigatório de parada. Lá existe um pequeno altar protegido por uma grade de ferro, dentro do qual há uma imagem de Nossa Senhora, onde nunca faltam velas acesas. Situa-se ao lado de uma pedra enorme. Depois das fotos, caiu uma chuva torrencial, debaixo da qual seguimos viagem até San Izidro, aonde chegamos por volta de seis e meia, já escurecendo.
Com muito frio por causa da chuva, decidimos que deveríamos dormir em San Izidro, um pequeno povoado numa região garimpeira, onde há gente que já viveu nos garimpos de Itaituba. Perguntamos se podíamos encontrar um hotel e nos indicaram um com preço salgado. Fomos atrás de um mais em conta e encontramos a Tosca Rey del Oro. Na frente, além do nome da pousada, também dizia que ali funcionava uma perfumaria esotérica. Como não sabíamos o que era aquilo, ficamos curiosos. A placa era de um lado, mas a entrada situava-se na parte de trás.
D. Eugênia, a dona do lugar, atendeu-nos muito bem. Pensamos que fosse devota de São Lázaro, porque havia uns vinte cachorros de tudo quanto era tamanho. Ela disse que podíamos entrar, pois eram mansos.
Logo na entrada sentimos um cheiro diferente, algo como incenso e outras coisas queimando. E era isso mesmo. O Jadir foi logo perguntando o que era aquilo, já sabendo do que se tratava. D. Eugênia ficou um pouco embaraçada, mas explicou que ali, algum tempo atrás funcionou uma casa de macumba, mas, naquele momento só havia uma PERFUMARIA ESOTÉRICA, nada mais, nada menos que uma casa que vende artigos para despachos, banhos de descarrego e outras coisas do gênero.
Estádio em Puerto la Cruz
O quarto era mais ou menos, com duas camas que não eram nenhuma maravilha, mas que davam para a gente dormir sossegados. O banheiro é que não era lá essas coisas. Quando não encontramos o chuveiro, perguntamos para o Alberto, sobrinho da D. Eugênia, ele nos mostrou um carote desses muito conhecidos em Itaituba, usados no transporte de diesel para o garimpo, com uma água fria de doer. Foi o jeito encarar.
Depois do banho fomos atrás de um táxi para irmos até Las Claritas, um povoado bem desenvolvido que também depende do garimpo para sobreviver, bem maior que  San Izidro. Queríamos encontrar um cyber para manter contato com a família. Entramos num Dodge Dart dos anos 80, cuja lataria estava caindo aos pedaços, mas o motor estava em plena forma. Só para dar a partida deve consumir uns dois litros de gasolina. Também, combustível na Venezuela é mais barato que água mineral!
O único cyber que encontramos estava lotado e fecharia em poucos minutos. O que nos restava era encontrar um lugar decente para comer. Paramos em frente a uma lanchonete, que parecia legal. Porém, quando vimos a maneira como o funcionário preparava os alimentos, desistimos na hora. Ele estava fazendo um X qualquer coisa para um cliente. Colocou o pão na chapa para esquentar, pegou uma panela velha, parecendo que não era lavada há algum tempo e amassou o pão. Não dava para encarar. Procuramos outro lugar e encontramos, tendo lanchado e retornado logo depois para a Tasca Rey del Oro.
Chegando ao quarto eu peguei a agenda para fazer as anotações das nossas atividades daquele que era o sétimo dia de viagem. O Jadir resolveu fazer uma seleção das fotos que estavam em sua máquina. Sua intenção era apagar algumas que não fossem muito interessantes para liberar espaço na memória. Só que, num descuido, ele acionou o comando errado e terminou apagando todas as fotos que tinha feito até aquele momento. Algumas fotos só ele tinha, pois minha máquina estivera guardada dentro da mochila, com medo de chuva, pois ainda não tinha proteção. Felizmente, a partir de Boa Vista eu já estava com a poderosa em mãos, registrando tudo. Naquela noite Jadir dormiu muito chateado.
Ao amanhecer do dia 15 de outubro, quarta-feira, já estávamos preparados para ganhar a estrada. Mas, o Alberto fez questão de preparar um café simples para a gente tomar. Só comeríamos nosso desjejum em Tumeremo às 9h30. De lá só paramos num posto de gasolina para abastecer, passando direto a hora do almoço, para ganharmos terreno. Passamos por Guasipati e Upata sem parar. Nosso objetivo era chegar à Ciudad Guayana, composta por San Felix de um lado do Rio Caroni, e por Puerto Ordaz do outro lado. O Rio Caroni é um importante afluente do Rio Orinoco.
Passava de meio dia em San Felix. Procuramos saber quais eram os lugares mais interessantes para se visitar, dois no máximo por causa do tempo. Fomos informados que eram Macagua, uma represa e Lloviza, um parque muito visitado. Lá fomos nós, primeiro na direção de Macagua, cuja entrada situa-se a poucos metros de uma rodovia de grande movimento. Chegando lá nos deparamos com uma guarita muito bem guarnecida, com militares armados por todos os lados.
Os soldados perguntaram o que queríamos. Respondemos que gostaríamos de conhecer a barragem. O funcionário informou que a entrada de pessoas estranhas era proibida,  jogando uma ducha fria em nossa curiosidade. Nisso aproximou-se um militar de fuzil na mão, cara de poucos amigos, querendo saber o que estava acontecendo, ao que o senhor que estava nos atendendo explicou o que desejávamos. Ele nos disse que havia o Parque Lloviza, o qual poderíamos visitar, sem contudo poder tirar fotos.
Não tinha graça. Sem fotos, nem pensar! Depois dessa, resolvemos que o melhor a fazer seria pegar a estrada e atravessar a ponte sobre o Rio Caroni para chegar a Puerto Ordaz, uma cidade maior e bem mais desenvolvida. Lá fizemos belas fotos na Plaza Bolivar e perto do Rio Caroni, sem perder muito tempo, pois Ciudad Bolivar nos aguardava.
Com uma estrada maravilhosa à nossa disposição, às 14h45 entramos na cidade histórica, primeira capital da Venezuela, onde o libertador Simon Bolivar viveu por algum tempo. Saímos perguntando onde se localizava a casa onde ele tinha morado e escrito seu famoso discurso, no qual renunciou a todos os poderes ilimitados que lhes tinham sido concedidos pela Assembleia Nacional, dando provas de seu ideal de liberdade.
Encontramos a casa, um local muito bem cuidado. Equivale mais ou menos ao tamanho de um quarteirão de Itaituba, totalmente arborizado, com recepcionista que funciona como guia, que nos mostrou  cada compartimento, cada detalhe. Fomos autorizados a fazer fotos da cama onde Simon Bolivar dormiu, da mesa na qual escreveu seu mais conhecido discurso e outras coisas, sem usar flash. Confesso que foi muito emocionante aquele momento pelo qual esperei muito, pois trata-se de uma das mais importantes figuras históricas da América do Sul.
Era só o que tínhamos para fazer em Ciudad Bolivar. A ordem era avançar o mais que pudéssemos com destino a El Tigre, distante 124 quilômetros. Mas, não havia como não parar na ponte metálica Angostura, uma belíssima obra de engenharia com a marca da qualidade brasileira, pois foi projetada e construída por empresa do Brasil. É realmente muito bonita. Não resistimos à tentação e paramos na lateral, no meio da ponte, com indicação de que ali era proibido estacionar. Fizemos algumas fotos, até que um militar passou e esbravejou de seu carro, fazendo gestos para que saíssemos, o que fizemos de pronto.
Já era noite, 18h40, quando finalmente chegamos a El Tigre, que não era uma pequena cidade, como nos disse a guia da Casa Simon Bolivar. O que encontramos foi uma cidade com um trânsito louco, o pior de todos até aquele momento. Pior até do que cidades bem maiores, como Puerto Ordaz e San Felix.
O Zé Maria, nosso anfitrião em Boa Vista, e sua esposa Nazaré nos recomendaram, expressamente, que evitássemos viajar de noite, pois encontraríamos grandes trechos de estradas sinuosas, com tráfego pesado, principalmente por causa do grande número de latas velhas compradas dos Estados Unidos, fabricadas nos anos 70 e 80, as quais entopem as estradas. Na medida do possível estamos seguindo o conselho, só entrando pela noite quando estamos para chegar a algum lugar para dormir.
Em El Tigre também não conseguimos um cyber para mandar notícias para casa, pois estavam todos fechados. O jeito foi voltar para o hotel, depois do jantar para tentar encontrar um canal na TV a cabo que qualquer hotel disponibiliza para seus hóspedes, por mais simples que seja, não só na Venezuela. Havia um jogo da Seleção Brasileira e a gente queria ver. Não havia nenhum transmitindo. Sem alternativa o jeito foi ver a Venezuela derrotar o Equador, para delírio de sua torcida, que começa a ficar mais ligada no futebol.  O Brasil perdeu para a Colômbia no Maracanã. Nesse caso não perdemos nada em não assistir ao jogo.
Depois de uma boa noite de sono amanhecemos dispostos, levantando bem cedo, loucos para chegar a Puerto la Cruz, cidade onde  a seleção venezuelana tinha jogado no dia anterior. Nosso destino era o estádio José Antônio Anzoategui, local onde o Brasil jogou a primeira fase da Copa América de 2007.
Preparamo-nos para sair de El Tigre, colocando capa de chuva, pois o tempo estava carrancudo. Acertamos em cheio na providência da capa, pois mal deu tempo de sair do hotel para que a chuva nos pegasse. E como choveu naquele começo de dia, até mais tarde, o que complicou um pouco nossa vida.***


Jota Parente

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