quinta-feira, junho 18, 2020

Procuradora pediu há um ano e seis meses, condenação de tucanos e inelegibilidade de Jatene

Procuradora pediu há 1 ano e 6 meses condenação de tucanos e inelegibilidade de Jatene

Uma ação de investigação judicial eleitoral, impetrada em janeiro de 2019 pela então procuradora regional eleitoral Nayana Fadul da Silva, tramita há um ano e seis meses no Tribunal Regional Eleitoral (TRE). Nesse processo, a procuradora pede a condenação do ex-governador Simão Jatene, de seu então candidato ao governo em 2018, o deputado Márcio Miranda, de Izabela Jatene de Souza, filha do ex-governador, além dos secretários de governo José Megale Filho e Pedro Abílio Torres do Carmo. A acusação é de “abuso de poder político e econômico”.

No caso de Simão Jatene – assim como dos outros denunciados -, a procuradora pede que eles sejam declarados inelegíveis por oito anos. Ou seja, caso o julgamento desse processo seja realizado antes das eleições deste ano de 2020 e em caso de condenação, o ex-governador Simão Jatene estaria impedido de concorrer à prefeitura de Belém com base na lei da ficha limpa.

Nas 17 páginas do pedido de cassação dos denunciados e cuja íntegra o Ver-o-Fato teve acesso, Nayana Fadul foca sua acusação também no programa “Asfalto na Cidade”, que consumiu dos cofres públicos R$ 550 milhões, mas que a procuradora eleitoral define como obra “eleitoreira e oportunista”. Segundo ela, o programa de asfaltamento em dezenas de municípios teve o “claro propósito de beneficiar a candidatura de Márcio Miranda ao governo e de José Megale, a vice. E dada a ampla repercussão dos atos, o reconhecimento do abuso de poder político-econômico é pertinente”, afirma a fiscal da lei.

“Inicialmente, faz-se importante registrar que abuso de poder político é espécie do gênero abuso de poder, razão pela qual a elucidação de ambos os conceitos vem a calhar, o que se faz recorrendo às lições de José Jairo Gomes (Direito Eleitoral. 12a ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 311 e 314-315): no Direito Eleitoral, por abuso de poder compreende-se o mau uso de direito, situação ou posição jurídicas com vistas a se exercer indevida e ilegítima influência em dada eleição.

“Ao realizarem seus misteres, os agentes públicos devem sempre guardar obediência aos princípios constitucionais regentes de suas atividades, nomeadamente os previstos no artigo 37 da Lei Maior, entre os quais avultam: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, licitação e o concurso público. 

A ação administrativo-estatal deve necessariamente pautar-se pelo atendimento do interesse público. (…). É intuitivo que a máquina administrativa não possa ser colocada a serviço de candidaturas no processo eleitoral, já que isso desvirtuaria completamente a ação estatal, além de desequilibrar o pleito – ferindo de morte a isonomia que deve permear as campanhas e imperar entre os candidatos – e fustigar o princípio republicano, que repudia tratamento privilegiado a pessoas ou classes sociais”, observa a procuradora ao citar o jurista.

Caracteriza-se o abuso de poder – enfatiza Nayana Fadul – quando demonstrado que o ato da administração, aparentemente regular e benéfico à população, teve como objetivo imediato o favorecimento de algum candidato. É o famoso brocardo do latim “Fraus omnia corrumpit”, ou na tradução literal “a fraude corrompe tudo”. Abuso de poder político configura-se quando agente público, valendo-se de sua condição funcional e em manifesto desvio de finalidade, compromete a legitimidade do pleito e a paridade de armas entre candidatos.

Vê-se, portanto, salienta mais adiante a procuradora, que a prática do abuso de poder político consiste na conduta que, utilizando-se das prerrogativas estatais para lograr benefício para determinada candidatura, “é dotada do pernicioso condão de comprometer a normalidade e legitimidade do pleito (vontade popular) ou de frustrar a isonomia de oportunidades entre os candidatos, valores nucleares do princípio republicano e da Democracia”.

Por sua vez, o abuso de poder econômico, nos ensinamentos de Rodrigo López Zilio, caracteriza- se, quando o uso indevido de parcela de poder financeiro é utilizado com intuito de obter vantagem, ainda que indireta ou reflexa, na disputa do pleito. Ela também cita o jurista José Jairo Gomes para definir o abuso de poder político-econômico: “de modo geral, os fatos que caracterizam abuso de poder político não se confundem com os que denotam abuso de poder econômico. Em tese, tais formas de abuso de poder são independentes entre si, de sorte que uma pode ocorrer sem que a outra se apresente. Mas em numerosos casos as duas figuras andam juntas. Esse fenômeno bem pode ser designado como abuso de poder “político-econômico”.

Aqui, o mau uso de poder político é acompanhado pelo econômico, estando ambos inexoravelmente unidos. Essa modalidade de abuso de poder tem sido reconhecida pela Corte Superior. A ver: “o abuso de poder econômico entrelaçado com o abuso de poder político pode ser objeto de Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME), porquanto abusa do poder econômico o candidato que despende recursos patrimoniais, públicos ou privados, dos quais detém o controle ou a gestão em contexto revelador de desbordamento ou excesso no emprego desses recursos em seu favorecimento eleitoral”.

“Em Estado historicamente patrimonialista como o brasileiro, onde o fisiologismo é prática corriqueira e a máquina estatal é posta abertamente a serviço de candidaturas, em que a elite e o poder econômico sempre dependeram do político e dos recursos do erário, não se pode ignorar o consórcio de abusos em apreço. O Brasil, aliás, é fruto de uma empresa: a empresa colonial da Coroa Portuguesa”.

No caso em concreto – enfatiza a procuradora Nayara Fadul -, “resta comprovado o abuso de poder político e econômico, na medida em que houve claro desvio de finalidade na utilização do programa “Asfalto na Cidade”, por parte de Simão Robison de Oliveira Jatene, governador do Estado do Pará, Pedro Abílio Torres do Carmo, secretário da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Obras Públicas (Sedop), a quem cabe a emissão das ordens de serviço, pagamentos e a condução do programa “Asfalto na Cidade” e Izabela Jatene de Oliveira Souza, secretária da Secretaria Extraordinária de Municípios Sustentáveis, responsável pela articulação das ações governamentais e implantação do Pará, em benefício da candidatura de Márcio Desidério Teixeira Miranda e de José Megale Filho”.

Ela também afirma no pedido ao TRE que Márcio Miranda, candidato ao governo do Estado, na função de Chefe do Legislativo, “participou ativamente de diversos atos de relacionado ao programa “Asfalto na Cidade”, algumas vezes falando ao microfone, em outras ocasiões “assinando” ordens de serviços, mesmo sem ter competência para isto, revelando o claro interesse para auferir benefício político nas eleições 2018”. Nayara cita folhas do processo em que há convites mencionando à população o nome do candidato Márcio Miranda, em vários eventos relacionados ao programa “Asfalto na Cidade”. Num deles, em Redenção, o povo é convidado a assistir a assinatura de ordem de serviços no dia 20 de maio de 2018. Em outras páginas há imagens do candidato no evento.

No processo constam ainda imagens de Márcio Miranda participando em várias cidades, de forma destacada, de atos do programa “Asfalto na Cidade”. Há também um vídeo utilizado por Márcio Miranda no período de campanha, em que ele declara que está em São Domingos do Capim, acompanhado da comitiva do governo do Estado do Pará, levando ordem de serviço para implementação do “Asfalto na Cidade”.

“O artigo 2, XIV da LC nº 64/1990 prevê como sanção ao abuso de poder político as penalidades de cassação de registro ou diploma e inelegibilidade, contudo, caso os investigados não sejam eleitos, como ocorreu no presente caso, caberá tão somente a aplicação da penalidade de inelegibilidade”, conclui a procuradora eleitoral.

Com a palavra, a desembargadora Luzia Nadja Nascimento

O processo, com o parecer final da procuradora eleitoral Nayara Fadul da Silva, está há 1 ano e 6 meses em poder da corregedora eleitoral do TRE, a desembargadora Luzia Nadja Nascimento, que até agora não se manifestou, na condição de relatora do caso. Só após a manifestação dela é que o processo entra em pauta para julgamento no plenário.

A demora, segundo se comenta, está causando estranheza nos corredores e gabinetes do Tribunal Eleitoral, pois contribui para retardar, sem nenhuma justificativa, uma decisão da corte eleitoral sobre o processo. Decisão essa que tanto pode ser benéfica como maléfica às pretensões políticas do ex-governador Simão Jatene, tido como eventual candidato à prefeitura de Belém, em outubro próximo, segundo fontes ligadas ao PSDB.

O que está acontecendo para a desembargadora retardar por tanto tempo a apresentação do voto dela? – questionam por outro lado advogados que atuam na corte eleitoral.

Cabe à desembargadora as explicações.

Fonte: Ver-o-fato

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