O Ministério Público Federal (MPF) enviou
recomendação nesta quinta-feira (15) a ministérios e órgãos públicos em
Brasília (DF) para que essas instituições não façam acertos sobre mineração em
terras indígenas com uma comitiva de 102 indígenas Munduruku, do sudoeste do
Pará. O grupo pretende defender a atividade ilegal em encontros com autoridades
públicas na capital federal durante a semana do Dia do Índio, que começa na
próxima segunda-feira (19).
Também não devem ser feitas tratativas com a
comitiva sobre o planejamento e a operação de ações de repressão e retirada de
garimpeiros/mineradores ilegais do território indígena Munduruku, no sudoeste
do Pará, recomenda o MPF.
A comitiva não representa o interesse da maioria
da etnia Munduruku, e sim apenas o interesse de mineradores ilegais que
aliciaram e financiam o grupo minoritário. Áudios postados em grupo de
garimpeiros revelam que a estratégia dos criminosos é levar os indígenas a
Brasília para barrar operações contra a mineração ilegal, e para pressionar
pela aprovação do Projeto de Lei 191/2020, que libera a mineração em terras
indígenas.
‘Matar
no ninho’ – “Mais uma vez se vê necessário ir pra
Brasília, levar uns dois ônibus lotados de índio, pra que nós podemos tentar
reverter esse quadro da Polícia Federal, que tá preparada pra vir aqui dentro
da área indígena, junto com o Ibama e Exército, igual veio da outra vez. Dessa
vez é ordem judicial, não tem como eles saírem fora”, diz o líder garimpeiro
Vilelú Inácio de Oliveira, o Vilela, referindo-se ao processo judicial em que o
MPF pede à Justiça Federal decisão para obrigar a atuação de forças federais na
região.
“Então se faz necessário ir pra Brasília pra
tentar matar esse passarinho no ninho, lá, e também o pedido da PL 191, pra
podermos legalizar, aí, nossa atividade dentro da terra indígena”, prossegue
Vilela. “A hora é agora, se alguém realmente que não tenha operação na terra
indígena, e queira que essa lei seja aprovada, é agora”, conclui.
Na recomendação o MPF aponta que “permanece em
vigor um estado de coisas totalmente ilegal e inconstitucional, em que, de
maneira evidente, determinados grupos organizados se sentem à vontade não
apenas para incorrer em crimes, como também para aliciar e buscar intervir
politicamente nas decisões dos órgãos e entidades de proteção territorial e de
prevenção e repressão aos ilícitos ambientais, inclusive para promover atos de
violência e interferir na realização da fiscalização ambiental”.
Grupo
sem representatividade e violento – A comitiva patrocinada pelos garimpeiros é formada
por grupo indígena Munduruku vinculado à associação indígena Pusuru, destaca a
recomendação. Segundo o protocolo de consulta prévia, livre e informada da
etnia, as decisões do povo Munduruku são tomadas em assembleia geral, e não por
associações.
O documento também cita que, em março, integrantes
da comitiva participaram tentativa de invasão armada a região próxima a uma das
principais bacias hidrográficas do território indígena Munduruku.
Além disso, também em março integrantes da comitiva
tiveram envolvimento na depredação do prédio da sede das mulheres indígenas
Munduruku Wakoborũn, de uso coletivo com outras organizações indígenas
antigarimpo.
Responsabilização da República – Para o MPF, esses
crimes “podem ensejar inclusive a responsabilização da República Federativa do
Brasil em foros de Justiça Internacional, o que impõe que as autoridades
públicas recomendadas ajam com especial cautela a fim de não corroborar as
omissões do Estado Brasileiro com o dever de proteção aos seus povos
originários”.
Em nota publicada no último dia 9, escritórios da
Organização das Nações Unidas (ONU) pediram urgência na tomada de medidas
efetivas para proteger os direitos do povo Munduruku, com a responsabilização
dos agentes envolvidos no ataque ocorrido à sede da Associação Wakoborũn, em
Jacareacanga (PA).
“A atuação dos indígenas favoráveis ao garimpo
perpassa o apoio político à campanha de exploração minerária. Trata-se de
indivíduos que praticam pessoalmente a extração irregular de minérios e coordenam
as frentes garimpeiras, em consórcio com pariwat’s (não indígenas), localizadas
no Território indígena dos Mundurukus, pelo que prestam também o apoio na parte
logística para entrada de máquinarios, à revelia dos membros Munduruku
contrários à atividade ilegal, convertendo os em proveito econômico particular
os bens e recursos que se destinam constitucionalmente ao usufruto coletivo da
etnia. Destacase ainda a pressão que exercem sobre membros da própria etnia
Munduruku se dá, por vezes, mediante ameaça, para forçar a aceitação da
mineração ilegal ou silenciar aqueles que são contrários”, detalha a
recomendação.
Demais
prejuízos – Na recomendação o MPF também cita que a
mineração tem promovido desmatamento, contaminação de rios, tráfico de drogas, prostituição,
e a disseminação da covid-19 nas terras indígenas. Sobre o risco da pandemia em
território Munduruku, o MPF observa que a ida da comitiva a Brasília sem
respeito a protocolos sanitários também pode representar risco de contaminação
pelo novo coronavírus nas aldeias, e por isso recomendou também que ministérios
e órgãos públicos orientem os indígenas a retornarem ao território Munduruku.
A recomendação foi enviada à Fundação Nacional do
Índio (Funai), à Agência Nacional de Mineração (ANM), ao Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente (Ibama) e às secretarias executivas dos ministérios do Meio
Ambiente, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Justiça e Segurança
Pública, e de Minas e Energia.
Assim que receberem o documento, os ministérios e
órgãos destinatários terão 24 horas para apresentar respostas. Recomendações
são instrumentos do Ministério Público que servem para alertar agentes públicos
sobre a necessidade de providências para resolver uma situação irregular ou que
possa levar a alguma irregularidade. O não acatamento infundado de uma
recomendação, ou a insuficiência dos fundamentos apresentados para não acatá-la
total ou parcialmente pode levar o Ministério Público a adotar medidas
judiciais cabíveis.
Fonte: Assessoria de Comuniucação do MPF
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